Robertina corria ladeira abaixo em direção à casa de uma família conhecida. Antes de chegar, porém, foi surpreendida com a presença de um rapaz. Sob uma grande árvore, ele retirava, com uma pá, porções de terra que jogava para o lado. Ela estacou em frente a ele, o olhou por um momento, e disse pausadamente:
- José Bittencourt, o que você está fazendo?
Interrompendo o trabalho, o rapaz respondeu:
- Estou construindo o caminho de nossas vidas.
Ela acordou em seguida, muito impressionada com o sonho, ouvindo o som de um motor longínquo. Chamou a mãe e perguntou que barulho era aquele, que ela nunca tinha ouvido. A mãe respondeu que era o caminhão dos Bittencourt.
Estamos sentadas uma em frente a outra, na cozinha. Ela tem um jeito sereno e enfático de falar e vai completando as idéias com gestos firmes, desenhando com o dedo indicador na toalha da mesa. Observo seu rosto já bem enrugado, seus olhos puxados, cabelos brancos apanhados num coque mal feito, seu ar de índia velha. No quarto, seu José. De regata branca puída e uma calça tão gasta quanto, ele brinca com a bisneta de seis anos, expressando o seu característico bom humor. Eles acabam de completar 60 anos de casados.
Na mesma semana em que sonhou com o noivo, Robertina o encontrou num baile. Nestes tempos, estes bailes da roça eram a principal atividade social para os jovens e muitos namoros começaram assim. Ela me contou que eles já se conheciam há muito tempo, mas que ele nunca tinha botado reparo nela. Neste dia, porém, ele disse ao irmão que estava cansado da vida de solteiro e que ia encontrar uma noiva no baile. Enquanto dançavam, ele pareceu notar pela primeira vez o encanto da moça de dezenove anos. Pediu-a em namoro. Ela, ao contrário, há muito esperava por esta oportunidade. Mas respondeu com astúcia feminina que era uma moça séria, não poderia dar uma resposta sem antes falar com a familia. A resposta? Somente no próximo baile.
Com um ar um tanto desgostoso, ela me conta que não foram décadas fáceis, que ele não foi exatamente um marido amoroso como ela gostaria. Muito séria, me confessa um segredo: houve um momento, até, com os filhos já crescidos, que ela chegou a juntar suas coisas para partir. Mas ficou. E foi construindo com José um caminho longo e sólido.
Há dois anos, liguei para sua casa, saudosa de me aproximar da sua sabedoria, sempre certa e tranqüila. É seu José quem atende. Me diz que é impossível falar com ela.
- A dona Robertina está no céu- me diz com um bom humor quase inadequado para a notícia.
Desligo o telefone sem me identificar.
- José Bittencourt, o que você está fazendo?
Interrompendo o trabalho, o rapaz respondeu:
- Estou construindo o caminho de nossas vidas.
Ela acordou em seguida, muito impressionada com o sonho, ouvindo o som de um motor longínquo. Chamou a mãe e perguntou que barulho era aquele, que ela nunca tinha ouvido. A mãe respondeu que era o caminhão dos Bittencourt.
Estamos sentadas uma em frente a outra, na cozinha. Ela tem um jeito sereno e enfático de falar e vai completando as idéias com gestos firmes, desenhando com o dedo indicador na toalha da mesa. Observo seu rosto já bem enrugado, seus olhos puxados, cabelos brancos apanhados num coque mal feito, seu ar de índia velha. No quarto, seu José. De regata branca puída e uma calça tão gasta quanto, ele brinca com a bisneta de seis anos, expressando o seu característico bom humor. Eles acabam de completar 60 anos de casados.
Na mesma semana em que sonhou com o noivo, Robertina o encontrou num baile. Nestes tempos, estes bailes da roça eram a principal atividade social para os jovens e muitos namoros começaram assim. Ela me contou que eles já se conheciam há muito tempo, mas que ele nunca tinha botado reparo nela. Neste dia, porém, ele disse ao irmão que estava cansado da vida de solteiro e que ia encontrar uma noiva no baile. Enquanto dançavam, ele pareceu notar pela primeira vez o encanto da moça de dezenove anos. Pediu-a em namoro. Ela, ao contrário, há muito esperava por esta oportunidade. Mas respondeu com astúcia feminina que era uma moça séria, não poderia dar uma resposta sem antes falar com a familia. A resposta? Somente no próximo baile.
Com um ar um tanto desgostoso, ela me conta que não foram décadas fáceis, que ele não foi exatamente um marido amoroso como ela gostaria. Muito séria, me confessa um segredo: houve um momento, até, com os filhos já crescidos, que ela chegou a juntar suas coisas para partir. Mas ficou. E foi construindo com José um caminho longo e sólido.
Há dois anos, liguei para sua casa, saudosa de me aproximar da sua sabedoria, sempre certa e tranqüila. É seu José quem atende. Me diz que é impossível falar com ela.
- A dona Robertina está no céu- me diz com um bom humor quase inadequado para a notícia.
Desligo o telefone sem me identificar.